ALLAN SOUZA LIMA E JOTA ANDRADE
SERTÃO ÍNTIMO
Curadoria: Marcus de Lontra Costa
16|07|23 - 29|07|23
No início do processo criativo todo artista é forasteiro da paisagem. O encantamento seduz e aproxima; a pesquisa e o método definem a composição, estruturam a forma e os volumes, elegem os espaços afetivos que estruturam a ação artística. Assim, a obra nasce, fruto dessa curiosa simbiose entre a paixão e a racionalidade. Esse é o conceito primordial do processo criativo da dupla de artistas Allan Souza Lima e Jota Andrade. No primeiro olhar, o espectador encontra a força da imagem fotográfica. Ela nos revela o solo árido, a arquitetura precária, o cotidiano discreto; na sequência surgem delicadas interferências poéticas, "fragmentos de um discurso amoroso” ¹ que nos convidam para percorrer caminhos de descobertas e encantamentos.
A ação fotográfica capta e congela momentos fugidios da paisagem. Essas fotografias dão início a um processo de seleção e edição das imagens. Sobre elas a dupla de artistas incorpora a luz, as frestas e as janelas por onde a obra transcende o campo bidimensional e se projeta como objeto híbrido, atuando na interseção do real e do imaginário, do externo e do íntimo, do plano e do volume, da luz interior que projeta céus abertos e mares profundos, “DeepSea”, como a dupla de criadores se define.
Diante desse cenário, dessa paisagem e dessa arquitetura construída, ermidas, cobogós, portas e janelas, valas, caveiras, objetos do cotidiano, compondo o repertório de um trabalho que se apropria da factualidade geográfica para produzir beleza, mistério e inquietação. O tempo rege o espírito de construção da obra. Assim, o sertão geográfico amplia seus horizontes e nos revela um ser-tão íntimo, que habita em todos nós, no desvão da nossa arquitetura humana, no gesto e no corpo que paira sobre essa paisagem de ausências.
A atuação profissional dos dois artistas na área da representação teatral e da cenografia valoriza a criação conjunta. Ela é essencial para revelar o processo construtivo determinado pela clareza da composição fotográfica e a delicadeza das interferências luminosas ou pictóricas que criam uma agradável sensação de harmonia e integração espacial. Aqui, tudo opera na direção do encantamento e do mistério. Trata-se, portanto, de um trabalho que incorpora diversos saberes dentro das expectativas da arte contemporânea e se afirma também como obra aberta, com vastos caminhos a serem percorridos.
¹ Roland Barthes
Marcus de Lontra Costa