EXPOSIÇÃO COLETIVA
Arthur Arnold, Edu Monteiro, Hal Wildson, Jan Kaláb,Marcos Roberto, Pedro Carneiro, Viviane Teixeira e Xico Chaves
RISCOS, BRECHAS E HORIZONTES
Curadoria: Erika Nascimento
06|08|22 - 20|08|22
"Oh, Pindorama eu quero o seu porto seguro
Suas palmeiras, suas feiras, seu café
Suas riquezas, praias, cachoeiras
Quero ver o seu povo de cabeça em pé"
(“Brasis”, música de Gabriel Moura, Jovi Joviniano e
Seu Jorge, interpretada por Elza Soares)
Uma bandeira de chumbo amassada e hasteada por um rústico mastro de viga de madeira com uma luz vermelha ilumina uma vastidão escura de parte da galeria. Essa luz vem de Mar Agitado (2022), instalação de Edu Monteiro. O chumbo, material utilizado pelo artista na construção da bandeira, remete aos anos de chumbo, repressão e golpe vividos na ditadura militar brasileira. Ao lado estão Caixas de Memórias Ancoradas na Pele (2020), uma montagem com caixas de aço retroiluminadas com fotografias de Laamb, também conhecida como luta senegalesa, impressas em pele de carneiro. Este mesmo aço guarda o díptico de fotografia da série Paisagem Vertical (2022), uma cartografia do artista acompanhando os desgastes e transformações das paisagens verticais do Sul do país.
A partir dessa proposição, “Riscos, brechas e horizontes” busca trazer luzes sobre as fissuras de um tempo complexo e desigual para se pensar o “outro”, a disputa por narrativas, construções de símbolos e as transformações como a potência de levante.
Neste sentido, na entrada da galeria somos recepcionados pela fotografia Olho na Justiça (1992) de Xico Chaves, uma ação performática na qual o artista inseriu olhos vesgos sobre a venda da escultura Justiça, de Alfredo Ceschiatti, instalada na Praça dos Três Poderes em Brasília. E ainda pelos objetos em garrafa pet pintados com tinta mineral preta e preenchidos com terra vermelha de Brasília onde estão estampados os dizeres Forças Ocultas (2008), que dá título ao trabalho do artista.
Ao longo da exposição, percorremos por tentativas de refletir a história desses muitos e complexos Brasis, como diz Eduardo Galeano: "Tudo nos é proibido, exceto cruzar os braços? A pobreza não está escrita nas estrelas, o subdesenvolvimento não é fruto de um obscuro desígnio de Deus. Correm anos de revolução, tempos de redenção”.
A série Páginas para um tempo em branco, de pinturas sobre metal, de Marcos Roberto, nos apresenta esses tempos de redenção, uma reconstrução do Brasil colonial para tentar dar conta das vidas invisibilizadas por uma sociedade e um passado desiguais, como em Reparação 1 (2022), em que o artista retrata Marina Firmina dos Reis (1822-1917), a primeira romancista negra do Brasil. Ainda no campo das lutas por repensar a história, Reescrever-Nova Utopia (2022), datilografado por Hal Wildson com milhares de letras, frases e palavras formando uma massa humana, alude a uma manifestação nas cores vermelho e preto advindas da tinta utilizada na máquina de escrever, para que o passado seja lembrado, e que não se repitam erros e injustiças.
Diante da atual disputa por símbolos e construções de falsos mitos, Fake News Histórico, série de Arthur Arnold, traz releituras de quadros brasileiros que retratam grandes marcos do nosso passado. Ruptura (2022), pintura com espessas camadas de argamassa, dissolve as manchas de um passado, como dos primeiros desembarques das caravelas portuguesas em terras brasileiras, para criar novas narrativas.
Ainda sobre heranças forçadas, um costume herdado da corte imperial brasileira era o ritual beija-mão, uma cerimônia pública na qual os súditos reverenciavam o rei. O Ritual Beija-mão faz parte da série de Viviane Teixeira, presente na exposição com a pintura A Ira (2015), em que as relações de poder de gênero são invertidas, e a rainha ganha voz e representatividade segurando um objeto fálico vermelho em sua mão. Nesse mesmo contexto, somos atravessados por A calma ainda é Tropicaos (2021), de Pedro Carneiro, que traz a relação das plantas com uma mulher negra e altiva, pintada sobre uma trama em rosa e azul, trazendo a serenidade perante uma relação diaspórica que forma o país.
Vamos imaginar por um instante que estamos diante de um aparelho caleidoscópio que a cada movimento teremos combinações variadas de efeitos visuais. Neste caso, a pintura Small Carnival Kaleidoscope (2022), de Jan Kaláb, já é um efeito deste movimento caleidoscópico. Nesta exposição, estamos diante de uma tentativa de juntar pequenos fragmentos, riscos e brechas de articulações para se criarem novos horizontes onde as relações de poder, precariedade e subalternidade são denunciadas.
Érika Nascimento [curadora]