EXPOSIÇÃO COLETIVA
Candido Portinari, Alberto Saraiva, Bruno Miguel, Carolina Ponte, Edu Monteiro, Jan Kaláb, Pedro Carneiro,
Rodrigo Martins, Toz e Yoko Nishio

Ensaio sobre a beleza
Curadoria: Bruno Miguel
20|02|25 - 22|03|25
Ensaio sobre a Beleza
Primeira semana de janeiro de 2025,
Segunda feira de manhã. Meu galerista me liga pedindo para nos encontrarmos.
- Bruno, caiu uma exposição do calendário e queria tua ajuda pra pensarmos em uma coletiva que misture artistas da galeria com alguns nomes de fora...
- Beleza Ricardo, mas tem algum tema ou assunto que você queira abordar?
- Quero que você leia o texto que o Vinicius escreveu. É a diretriz criativa da galeria para esse ano. Quero que a Movimento se reaproxime do sensível e do belo, sinto falta de oferecer uma relação mais objetiva com a emoção nas exposições. Acredito que outras pautas são mais urgentes, mas é importante manter o contato com o sublime, desejo que a Movimento vá nessa direção esse ano.
- Ricardo, eu topo! Vou curtir fazer essa curadoria. Bora fazer uma exposição leve e despretensiosa, mas elegante. Não vou aprofundar conceitualmente de forma acadêmica, vamos deixar que a seleção das obras mostre o caminho de leitura que gostaríamos que o espectador tivesse. Poucos artistas, uma montagem quase careta, sabe... Acho que de certa forma isso pode carregar uma ironia velada que me agrada.
- Conversei com o Vinicius aqui e achamos que vai funcionar. Mas Bruno, faço questão que você participe também como artista, OK? como você pensa no texto?
- Então... Acho que posso brincar com isso. Usar de metalinguagem, tipo um texto dentro do outro, meio que como se fosse uma conversa em que externamos o processo de construção de uma exposição. Pode ser interessante para que o público, artistas e alunos naturalizem e desmistifiquem um processo curatorial. Aqui é uma galeria, não uma instituição, os paradigmas são outros, de certa forma os objetivos também. Boas galerias ajudam na construção da carreira dos seus artistas, mas estamos falando de mercado, né... galeria tem que vender. Porém não estamos falando de produtos. E sim de algo carregado de história, sensibilidade e simbolismos e que nesse recorte que farei das obras e artistas, vai estar focado no que você me pediu, “BELEZA”. E escrevo entre aspas porque sei que não existe “uma beleza”, sei que é um conceito relativo e de forma alguma cairia na cilada de tentar afirmar o que é belo ou não. Vou tentar me concentrar nessa experiência do encantamento. Do sublime quando o indivíduo se depara com algo especial. Algo que por mais banal que seja pode “marcar” a gente. Você me entende?
- Acho que sim.
- Quando eu paro pra pensar nessa sensação que desejo que o outro alcance, me vem à memória algumas experiências muito singelas. Por exemplo, lembro de quando eu tinha uns 8 anos e deitado no chão, ao lado da cama dos meus pais, fiquei vendo as partículas de poeira dançando no feixe de luz matinal que cortava o quarto escuro pela fresta das cortinas. Juro que sou capaz de sentir o calor daquela luz até hoje se eu fechar os olhos e me concentrar. Pior é que eu estava tão hipnotizado que nem precisei esticar o braço pra deixar a luz me tocar, no tempo certo, ela veio até mim. A arte faz isso conosco... Pensar nisso está abrindo várias gavetas aqui dentro. Com vinte e poucos anos fui num show na praia de Gaibu, em Pernambuco. Já era madrugada, eu estava lá com a Bienal da UNE, universitários do país inteiro. A maré estava super baixa, mar muito calmo. Caminhei pra dentro d`água até começar a ouvir o som bem longe, me distanciei bastante da areia e mesmo assim a água batia na cintura, me deitei e comecei a boiar. Ali flutuando, com os ouvidos debaixo d`água, sentindo os graves da música conversando com meu corpo, a lua cheia vaidosa no céu, iluminando meus pensamentos e a brisa salgada do mar suspirando na minha pele molhada... Naquela época eu ainda não tinha religião, mas pra mim aquilo foi sagrado, foi um contato com o divino. Era a natureza me mostrando a beleza da minha insignificância. Contemplar algo dessa magnitude muda a gente. A arte faz isso também. Já assisti o filme “A Grande Beleza” do Paolo Sorrentino umas quinze vezes, até hoje choro como uma criança quando o filme acaba, fico soluçando na cena final do barco no rio.
- Bonito isso.
- Pensando no que o Vinicius colocou lá no começo do texto das diretrizes da galeria pra esse ano. “...a Galeria Movimento propõe uma reflexão sobre a formação da subjetividade individual”, acredito que é a isso que vou me apegar nessa curadoria, à tentativa de escavar o íntimo adormecido. Buscar a cumplicidade subjetiva com a cor, a forma, a narrativa, a paisagem, a cidade, a memória, o corpo... mas principalmente com o outro.
(alguns instantes de silêncio antes de um longo suspiro)
A arte faz isso.
Bruno Miguel
(Diretriz criativa 2025)
JANELA PARTICULAR
Em 2025, a Galeria Movimento propõe uma reflexão sobre a formação da subjetividade individual, retomando temas que exploram a sensibilidade por meio de um discurso honesto e de uma conexão íntima entre obra e público. Ao evocar o familiar, buscamos acessar memórias que nos aproximam dos valores e princípios que nos guiam, promovendo o crescimento individual e, por consequência, o coletivo.
A arte, nesse contexto, desempenha um papel essencial: provocar, emocionar e fazer pensar. Cabe ao artista criar experiências que despertem um senso de pertencimento e ao mesmo tempo desafiem o espectador a olhar para dentro de si. É através desse encontro que se estabelecem as conexões mais profundas, capazes de transformar tanto o criador quanto o público.
A poesia, como forma de resistência à vida automatizada, emerge nesse contexto como um canal de transformação. Em um mundo de subjetividades organizadas em planilhas, onde imprevistos são anulados e futuros, sequestrados, Franco Berardi aponta para a urgência de fundar novas imaginações. Essa nova linguagem, fruto da desautomatização e do resgate da independência criativa, torna-se essencial para a reconstrução de nossas individualidades.
Assim, “Janela Particular” convida cada um de nós a abrir a cortina do próprio eu, permitindo que a luz da arte nos guie em um processo de redescoberta, inspiração e resistência.
Vinicius Fadel
